O texto “Considerações em torno do ato de estudar” escrito por Paulo Freire, faz parte de um conjunto de escritos que compõe o livro “Ação Cultural para a Liberdade”, publicado pela editora Paz e Terra em 1981. Nele, o educador brasileiro defende que “quem recebe uma bibliografia para estudar, deve ter nela, não uma prescrição dogmática de leituras, mas um desafio. Desafio que se fará mais concreto na medida em que comece a estudar os livros citados e não a lê-los por alto, como se os folheasse, apenas”. (Freire, 1981)
Para Freire, o ato de estudar exige uma postura crítica, sistemática e uma disciplina intelectual, e não apenas uma ação de memorização. O que se espera do educando é que ele se sinta desafiado, que busque a compreensão do conteúdo e se aproprie da sua significação profunda.
O autor descreve cinco atitudes para os que desejam adotar esta postura crítica: alcançar o papel de sujeito deste ato, ter uma atitude em frente ao mundo, ser curioso, assumir uma relação de diálogo com o autor do texto e manter-se humilde.
Freire também faz provocações sobre o papel do educador no sistema de aprendizado. O texto cita que a bibliografia recomendada deve refletir uma intenção fundamental, que é de “despertar o desejo de aprofundar os conhecimentos”(Freire, 1981). Desta forma, o educador é responsável em aumentar a autonomia crítica dos estudantes, possível especialmente pela prática da “pedagogia para a liberdade” (Freire, 2015).
Sobre esse papel do professor, a Prof. Dra. Maria Judith, da UFRJ, cita:
“Aprendizagem é possível por meio de aquisição de algo novo, e mesmo que os alunos tenham de descobrir algo, professores devem ensiná-los, o que não caracteriza uma filosofia da educação opressora. Finalmente, propomos que professores forneçam informação aos alunos para torná-los ricos de materiais que possam multiplicar e usar segundo o próprio discernimento” (Lins, 2011).
Neste cenário de estímulos à criatividade, à reflexão e ao pensamento crítico, o educando se transforma em sujeito e não em objeto. Com o espírito investigativo, este indivíduo curioso encontra um campo fértil para desempenhar o protagonismo da sua história, numa posição questionadora e de tomada de consciência.
Mas, o contexto da história do educando nem sempre é favorável para o exercício da sua postura crítica. No desenvolvimento da sua aprendizagem algumas barreiras podem ser decisivas para o resultado dos estudos, como: a prevalência de uma “educação bancária”(Lins, 2011), métodos de avaliação ultrapassados, instituições mercantilizadas, profissionais desatualizados e um sistema que avança cada dia mais para uma visão mercadológica da educação.
Não há como concretizar uma cultura da criticidade sem a aplicação de novas metodologias de aprendizagem e sem a quebra de paradigmas. Há de se respeitar por exemplo, as novas tecnologias e as relações entre educação e humanismo. Sendo, “o fenômeno da aprendizagem uma realidade cotidiana”(Lins, 2011), é importante que o ato de estudar esteja presente de forma espontânea na vida do educando, que ele não seja consumido pela doutrina da quantidade de páginas lidas, mas como cita Freire, que ele descubra o “estudar não como um ato de consumir ideias, mas de criá-las e recriá-las”(Freire, 1981).
Pode-se concluir que o processo de aprendizagem e o ato de estudar assemelha-se com um jogo, onde: cada indivíduo assume a sua posição de comando (sujeito), as intenções orientam as regras e a metodologia, seguem-se os desafios guiados pela curiosidade, avança-se os níveis de protagonismo conforme o sujeito amadurece o pensamento crítico e finalmente, surge a conquista da recompensa, a liberdade.
Artigo de Sheila Rocha para disciplina Educação ao Longo da Vida | Escola Superior de Educação de Coimbra (ESEC)
Referências Bibliográficas
Freire,P.(1981).Considerações em torno do ato de estudar (Paz e Terra,Ed.;5. ed.).Ação Cultural para a Liberdade.
Freire, P. (2015). Educação e Política: reflexões sociológicas sobre uma pedagogia da liberdade. Em Paz e Terra (Ed.), Educação como prática de liberdade (Kindle).
Lins, M. (2011). Educação Bancária: uma questão filosófica de aprendizagem. Faculdade de Educação – UFRJ.




